O nosso trabalho diz muito sobre resgate de memória e hábitos cotidianos. Acreditamos que eles devem ser executados com respeito e atenção ao tempo e história das coisas. Nossas formações acadêmicas no design tiveram, assim como nossas pesquisas de materiais e todos os processos desenvolvidos hoje pelo Estúdio Veste têm muito da inspiração do ambiente do centro da cidade, do pequeno comércio de rua, das mercearias e lojinhas do interior. Isso vem impresso desde o projeto arquitetônico da Loja-Ateliê, executado com muito respeito pela Balsa Arquitetura, mantendo a loja como era para ser: piso e paredes no seu estado original, aproveitando e conectando ali todo o nosso acervo de móveis e objetos, um espaço de história, mas todo prático e em uso constante.
Um dia, enquanto montávamos a loja, fomos destacando para a Anna e a Amanda, do Studio Tertúlia, alguns dos objetos dali, resultando nessas fotos lindas que vocês podem ver abaixo. Cada pedacinho tem sua particularidade, cada objeto conta uma história importante e eu, Luísa, vou contar um pouquinho aqui pra vocês.
Os manequins no meio da loja, de cara, são o maior símbolo de que ali funciona um ateliê de costura. Representam também toda a nossa admiração por aquele fazer e por quem fez antes da gente e nos inspira até hoje. O manequim restaurado com pé de madeira foi um presente de Lia, com as suas medidas de moça. Lia é nossa musa inspiradora do ser e do fazer, minha avó e mãe da Dane.
O armário de madeira, que guarda nosso estoque, era um antigo livreiro que veio de herança quando meu avô, Zé Acácio, comprou uma casa em Montes Claros, norte de Minas, onde vive parte da nossa família materna.
Muitos outros móveis vieram de Cajuru, São Paulo, onde moram meus pais, e fazem parte da história da minha família paterna: as escrivaninhas pertenceram ao meu bisavô, Gino, e a outra à minha Vó Yara; a estante da copa era onde ficavam os livros do meu Vô Pessanha, em seu consultório e um dos armários era sua sapateira – trocamos os puxadores e virou um móvel feito quase que sob medida para embalagens e aviamentos. A máquina de costura alemã, muito conservada em sua mala maravilhosa, pertenceu à Inah, minha bisavó. As luminárias nas nossas mesas de trabalho também, uma foi do Vô Gino e a outra foi do seu neto e maior fã, meu pai. A balancinha e as bacias de ágata na copa fazem parte do acervo da pequena fábrica de cosméticos que minha mãe teve anos atrás, assim como a papeleira pequena, que a gente usa com o barbante. Incrivelmente, quando compramos a papeleira grande para os papéis de embalagem era exatamente igual, tipo a irmã mais velha da outra!
Há outros itens ali que também nos emocionam muito. Desde pequena adoro passear no mercado, ou todo tipo de vendinha, padaria, mercearia. Em Cajuru, na rua da casa onde cresci, ficava a Mercearia Benvenuto, de onde eu era frequentadora assídua. Quando a família fechou o seu comércio, minha mãe, já sabendo do meu gosto, me presenteou com latas de mantimentos vindas de lá e que hoje fazem sucesso nas prateleiras da nossa loja! Quando estávamos ainda planejando nosso espaço, pedi a ela que conseguisse fotos da Mercearia, pra ver se eu me lembrava mesmo como era e pra nos servir de referência. Eis que, além das fotos, o filho do fundador, João Benvenuto, nos mandou também de presente um ladrilho hidráulico que era parte do piso original da casa onde funcionava a Mercearia, um pequeno fichário onde o seu pai guardava as anotações de inadimplência (quer maior símbolo do comerciante que esse? rs) e também um gancho de balança, provavelmente a mais antiga de lá.
Os banquinhos que ficam na nossa porta são carteiras escolares da década de 60, que pertenciam a um grupo escolar municipal de Cajuru, restaurados pela minha mãe de presente pra gente. Na verdade, todas as nossas cadeiras são “importadas” de Cajuru, inclusive a nossa estrela, a cadeira “servimos bem para servir sempre”, de madeira, pintada a mão pelo amigo e artista local Neto Morgado.
A escada de madeira em que penduramos os panos de mesa foi da loja de velas Jurema, uma das mais antigas alí no Mercado Novo, um presente da dona Nilce logo nos nossos primeiros dias de obra. A pia de louça também é original do Mercado, só estava manchada e quebrada, mas nada que paciência, soda cáustica e massa plástica não deem um jeito!
Pensamos em cada detalhe e decoramos como sempre fazemos em casa: com elementos simples e muitas vezes dando outros significados para os objetos que fazem sentido pra gente.
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